No mês de dezembro de 2024, serão analisadas as condições de admissibilidade e a capacidade econômico-financeira das instituições de ensino superior que se candidataram à abertura de cursos de medicina por meio do chamamento público.
O chamamento seguiu seu curso mesmo após o Supremo Tribunal Federal, na ADC 81, reafirmar a “possibilidade de a sociedade civil solicitar a abertura de editais para a criação de novos cursos em localidades específicas”. O MEC não assegurou plenamente esse direito, estabelecendo, na prática, regras que restringem a criação de novos cursos amparados pela decisão do STF. A sociedade civil não teve vez e, provavelmente, não terá por muito tempo, pois já existem documentos técnicos que limitam o número de vagas nos próximos anos.
Agora, no certame do Edital 01/2023, começa o julgamento das fases já citadas e o primeiro deles, seguindo o texto do instrumento convocatório, será a verificação das condições de admissibilidade das mantenedoras de suas propostas.
Mesmo diante do esforço e do cuidado da Secretaria de Regulação, essa fase ainda contém texto e questões problemáticas. Por exemplo, são estipulados, no item 6.1, temas relativos a) à regularidade jurídica, regulatória e fiscal da mantenedora; b) às condições de admissibilidade previstas no item 5; e c) à completude, validade e consistência dos documentos referidos no item 10.2.2 deste Edital. Mas o item 6.4.1 diz que “Os documentos relativos à regularidade jurídica, regulatória e fiscal da mantenedora são aqueles arrolados no item 10.2.2”. Assim, itens “a” e “c”, na prática, se referem à avaliação das mesmas evidências.
O edital permite escolher entre três atos autorizativos. Primeiro, a autorização de curso de medicina em IES existente na cidade. Segundo, o credenciamento de uma nova IES. Terceiro, o credenciamento de um campus fora de sede para IES já credenciada, porém sem sede na cidade escolhida.
Para as mantenedoras, em todos esses casos serão avaliados: um memorial contendo o histórico de atuação da empresa/entidade e de suas IES; e o CNPJ; e a regularidade desta perante a Fazenda Pública, o INSS e o FGTS. Nesse sentido, será avaliada em primeiro lugar a regularidade jurídica e fiscal da proponente.
Para a mantida, a IES, será exigida a apresentação da proposta completa, que consiste nos projetos, planos e documentos previstos nos itens 10.2.2.1 conforme o ato autorizativo escolhido.
Quanto ao memorial e às propostas haverá, provavelmente, apenas a constatação do envio, pois sua análise ocorrerá na fase seguinte. Mas a regularidade jurídica e fiscal poderá ser objeto de discussão, isto porque além de reiterada jurisprudência contrária à exigência das certidões negativas existe, hoje, uma regra clara na atual Lei de licitações: “serão exigidos os documentos relativos à regularidade fiscal, em qualquer caso,somente em momento posterior ao julgamento das propostas, e apenas do licitante mais bem classificado” (Art. 63, III, da Lei 14.133/2021). Esta regra já valia para pequenas empresas (art. 42 da Lei Complementar nº 123/06), agora vale para todos.
Quanto à regularidade jurídica, é relevante dizer que foi acrescentada em 2024 uma regra importante: a necessidade de autodeclaração dos grupos econômicos. Hoje, o item 5.3.2 prevê que a mantenedora pertencente a grupo não declarado terá sua proposta eliminada.
As condições de admissibilidade incluem ainda as “previstas no item 5” do edital.
Este tópico trata de questões relativas às propostas, à mantenedora e à IES mantida. As propostas são limitadas a duas por mantenedora, uma em cada estado ou unidade territorial, conforme o edital (item 5.4). Grupos educacionais podem usar suas mantenedoras, porém, só podem apresentar uma proposta do grupo por estado (item 5.3).
No caso das mantenedoras não serão admitidas as que possuam sanções aplicadas a alguma de suas mantidas de natureza institucional, nos últimos 3 (três) anos ou que possuam penalidades aplicadas ao curso de Medicina de alguma de suas mantidas nos últimos 6 (seis) anos, sempre contados da data de publicação deste Edital. Os dois casos são juridicamente contestáveis, afinal há uma proibição do chamado bis in idem, ou seja, da dupla punição pela mesma penalidade.
Além dessas inadmissões, o item 5.2 prevê ainda que não poderão participar “Consórcios de Mantenedoras ou quaisquer outras formas ou institutos jurídicos que reúnam Mantenedoras para fins de apresentação de propostas”. Esta era uma regra comum nos editais anteriores, apesar de ter sido admitida, por exemplo, no edital de transferência assistida da Universidade Gama Filho em 2014. Por algum motivo, hospitais e mantenedoras de instituições de ensino ou mantenedoras unidas em uma única proposta não são admitidas.
O problema, neste caso, é que a Lei 14.133/2021 afirma que: “Salvo vedação devidamente justificada no processo licitatório, pessoa jurídica poderá participar de licitação em consórcio” e neste caso não há justificativa técnica e pública. Este pode ser outro problema jurídico a ser enfrentado pelo procedimento do MEC.
Por fim, a mantenedora/empresa sem IES credenciada deverá requerer a segunda opção, sob pena de ser inadmitida (item 5.6).
A última categoria de exigências é sobre as IES mantidas que pleiteiam a autorização ou o campus fora de sede. Nesse caso são quatro condições: a) possuir ato autorizativo institucional válido; b) ter Conceito Institucional (CI) igual ou maior que 3; c) não ter sofrido penalidade de caráter institucional ou em cursos da área de saúde, nos últimos 3 (três) anos; e d) não possuir medida de supervisão vigente de caráter institucional ou em cursos da área de saúde, considerando como data de referências ou data inicial desses prazos a de publicação deste Edital. Além disso, a mantenedora que buscar credenciamento de campus fora de sede deve indicar uma IES que possua CI igual a 4, no mínimo.
Nesta lista observa-se uma grave distorção: a inclusão do requisito de “não possuir medida de supervisão vigente de caráter institucional”, isto porque o fato de enfrentar um processo de saneamento ou sanção (item 5.8) ou o de ter recurso pendente não deveriam ter como consequência a inadmissão. Por outro lado, o próprio edital prevê que “Não será considerada supervisão vigente aquela na qual tenha havido revogação das medidas cautelares até a data limite para a apresentação das propostas” (item 5.8.1), mas quem criou a regra esqueceu-se de que muitas supervisões não resultam em medidas cautelares. No contexto previsto, instituições com cautelares revogadas e processos ativos serão privilegiadas. Isso ocorrerá em detrimento de entidades que, embora sob supervisão, nunca sofreram medidas cautelares, em casos menos graves. Essa distorção, gravíssima, deveria ser corrigida, caso contrário gerará justas disputas judiciais.
Enfim, esses devem ser os próximos passos e os percalços da fase de admissibilidade do novo chamamento público do Programa Mais Médicos. Oxalá, não seja o início de 2025 conturbado para quem participa e quem rege o procedimento.
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