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Ana Luiza Santos e Edgar Jacobs

Conanda publica resolução sobre segurança e proteção em unidades socioeducativas

Atualizado: há 7 dias


O Conselho Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente - CONANDA - publicou a Resolução nº 252, de 16 de outubro de 2024, que dispõe sobre as diretrizes nacionais para a segurança e proteção integral de adolescentes e jovens em restrição e privação de liberdade no Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo.


A norma foi elaborada depois de muitos debates entre diversos participantes do sistema socioeducativo, em momento em que se busca, por uma parcela da sociedade, a inserção dos agentes socioeducativos no Sistema Único de Segurança Pública e a concessão, para uso em serviço, de porte de arma de fogo para estes funcionários.


Há um Projeto de Lei, inclusive, que transforma os agentes socioeducativos em integrantes operacionais do Susp (Lei 13.675/18), reconhecendo, pois, a natureza policial da atividade exercida por agentes socioeducativos e penitenciários.


No caso, portanto, a resolução tem sido vista como um importante marco na regulamentação do uso da força nas unidades socioeducativas do país. Ela representa a humanização do tratamento socioeducativo, ligando a socioeducação à garantia de direitos e proteção dos adolescentes em cumprimento de medidas de internação e semiliberdade. Afinal, não há aprendizagem e reabilitação sem respeito e banimento de práticas vexatórias ou intimidantes.


Importante constatar que, até então, não havia parâmetros objetivos para todo o território nacional no que toca aos procedimentos de segurança em unidades socioeducativas.


As medidas socioeducativas


No caso de um adolescente ser apreendido em flagrante praticando ato infracional - conduta descrita em nossa lei como crime ou contravenção penal, cometida por um adolescente (art. 103 do ECA) - ele será encaminhado à autoridade policial competente para as providências rotineiras. Se o ato infracional for leve, o adolescente será liberado e entregue aos seus responsáveis legais, mediante termo de compromisso de se apresentar ao Promotor de Justiça assim que possível, de preferência no mesmo dia.


O Promotor de Justiça poderá arquivar os autos, conceder a remissão (uma espécie de perdão prevista na lei penal) ou representar à autoridade judiciária para aplicação de medida socioeducativa, de acordo com o artigo 180 do ECA, incisos I ao III.


Se o ato infracional for grave, o adolescente poderá permanecer apreendido ou acautelado – que são os termos utilizados nestes casos - e será encaminhado imediatamente ao Promotor de Justiça, podendo ser internado provisoriamente por até 45 dias, prazo para o encerramento do processo que deve resultar uma sentença que pode ou não lhe aplicar uma medida socioeducativa.


Medidas socioeducativas são, portanto, a resposta que o Estado entrega ao adolescente que pratica ato infracional, sempre de acordo com as predeterminações do ECA.


Somente o magistrado da vara da infância e juventude é competente para aplicar e acompanhar a execução da medida socioeducativa, sendo seis as medidas previstas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, quais sejam: a advertência; a reparação de dano; a prestação de serviço à comunidade; a liberdade assistida; a semiliberdade e a internação em estabelecimento educacional.


As medidas que nos interessam no momento são as de semiliberdade e a de internação em estabelecimento educacional, pois incluem cumprimento de atividades pedagógicas e formativas sob custódia do Estado.


A Resolução


Pois bem, a resolução do Conanda é direcionada aos adolescentes que sofreram as medidas citadas e que estão em restrição e privação de liberdade no Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase). Ela pretende garantir um tratamento digno e respeitoso durante o cumprimento da medida, além de reduzir o risco de violências e lesões, contribuindo para um ambiente mais seguro e saudável.


Uma das decisões é a proibição de armamento na lida com os educandos, o que foi decidido na contramão da lógica tradicional da segurança que criminaliza e estigmatiza as adolescências normalmente pobres que estão retidas pelo Estado. Além disto, a Resolução determina o respeito à identidade de gênero e a importância do cofinanciamento do sistema socioeducativo para garantir a qualidade do atendimento.


A norma também determina princípios que devem ser seguidos por todos os socioeducadores que atuam nas unidades, no âmbito do cumprimento das medidas socioeducativas, como, por exemplo, uma gestão democrática, participativa e transparente, assegurando o diálogo permanente com os Conselhos dos Direitos e Tutelares, com a comunidade e com a sociedade civil organizada e toda rede do Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente.


Entre as diretrizes está a prestação de atendimento humanizado, considerando aspectos sociais, culturais, étnicos, raciais, psicológicos, de deficiência, de gênero e de sexualidade; a garantia do sigilo, a confidencialidade e a proteção de todas as informações obtidas em razão do atendimento profissional; a atuação de forma interdisciplinar, possibilitando avaliações diagnósticas e acompanhamentos contínuos para assegurar o desenvolvimento integral dos adolescentes e jovens, entre outras ações.


As medidas socioeducativas são estabelecidas como instrumento de controle e segurança social para que os adolescentes sejam educados pedagogicamente pelos atos infracionais que cometeram.  Caso estes indivíduos se deparem com situações degradantes, de tratamento vexatório e até tortura, a implementação das medidas será de total inefetividade prática, além do absurdo desrespeito aos direitos fundamentais dos adolescentes no país.


Infelizmente, foi preciso uma Resolução do Conanda para proibir condutas nitidamente indevidas contra os adolescentes; outras previsões da norma repetem direitos básicos assegurados a todos pela Constituição, de forma expressa ou não.


Exemplificadamente, podemos citar que, em caso de necessidade de imobilizar temporariamente um interno, sugere-se o uso de armamentos menos letais para evitar mortes e ferimentos permanentes, dentre eles os dispositivos elétricos incapacitantes, que emitem pulsos elétricos; balas de borracha; sprays irritantes como o de pimenta ou gengibre; granadas de efeito moral e cassetetes.


Intervenções corporais compulsórias, como cortes de cabelo, são proibidos e a revista pessoal deve ser detalhada, porém, não invasiva e deve ser realizada na presença de mais de um profissional.


O jovem deve receber material de higiene pessoal em quantidade suficiente e deve ter garantido o direito à participação em atividades educativas, recreativas, culturais e esportivas ofertadas pela unidade socioeducativa, bem como o direto à convivência familiar e comunitária, além de todos os outros direitos assegurados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).


Caso necessite ser encaminhado a um serviço de saúde, o MP, a Defensoria Pública e o Conselho estadual ou distrital dos Direitos da Criança e do Adolescente devem ser comunicados imediatamente.


Conteúdo da resolução que desencadeou contrariedade foi relativo à adoção de trajes civis pelos agentes que trabalham dentro das instituições. Eles deverão ser distintos dos usados no sistema penal, pela segurança pública ou pelas forças armadas, para preservar o caráter socioeducativo e não punitivo dos estabelecimentos socioeducativos.

Este e outros aspectos suscitaram agastamento com deputados ligados ao setor da segurança pública. Além do já mencionado projeto de Lei, neste momento há a tentativa de barrar os efeitos da resolução pelo protocolo na Câmara dos Deputados do Projeto de Decreto Legislativo (n. 363/2024).


A justificativa do autor do Projeto, ex-integrante das forças de segurança pública e mestre em Direitos Humanos pela UFMG, é que a norma retira importantes prerrogativas dos Agentes de Segurança Socioeducativos, precarizando suas funções e comprometendo a segurança nas unidades. A Coalização pela Socioeducação, por sua vez, alerta que o deputado, “ao tentar reverter a resolução, ignora o papel central do CONANDA na promoção de direitos humanos e na construção de políticas públicas que garantam o cumprimento do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).”


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