A lei 14.172/21 dispõe sobre a assistência da União para garantir acesso à internet, com fins educacionais, aos alunos e aos professores, determinando o repasse de R$ 3,5 bilhões do orçamento para a educação básica pública.
O projeto que gerou a lei foi inicialmente vetado pelo presidente da República, mas o veto foi rejeitado pelo Congresso Nacional. Em seguida, sob a justificativa de que não havia estimativa do impacto orçamentário e financeiro gerado pelo projeto de lei, a Advocacia-Geral da União protocolou no Supremo Tribunal Federal uma ação direta de inconstitucionalidade – com pedido de liminar urgente. Trata-se da ADI 6.926.
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O projeto
O projeto é de autoria da Câmara e foi aprovado pelo Senado em 24 de fevereiro. A norma determina um repasse de R$ 3,5 bilhões da União para Estados, Distrito Federal e municípios investirem na ampliação do acesso à internet. Os recursos podem assegurar a oferta mensal de 20 gigabytes de acesso à internet para todos os professores do ensino fundamental e médio das redes estaduais e municipais.
Os alunos da rede pública do ensino fundamental e médio integrantes de famílias vinculadas ao CadÚnico (Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal) são os beneficiários do projeto, bem como todos os estudantes matriculados nas escolas das comunidades indígenas e quilombolas.
A lei prevê que, em caso de inexistência de acesso à rede móvel na região ou a modalidade de conexão fixa para domicílios ou comunidades se mostre mais barata, o acesso à banda larga poderá ser contratado. E mais: uma parte dos recursos pode ser usada para aquisição de celulares/tablets que possibilitem acesso dos estudantes e professores à internet. A critério das administrações locais, os gadgets poderão ser disponibilizados a professores e alunos, em caráter permanente ou temporário.
A ADI 6.926
A AGU sustentou que a lei 14.172/21 violava o devido processo legislativo; as condicionantes fiscais para a aprovação de ações governamentais durante a pandemia; as regras de custeio de políticas públicas de acesso à educação; e os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
Apontou que, apesar da boa intenção da norma, a transferência de recursos deveria ocorrer com observância do modelo de responsabilidade fiscal estabelecido na Constituição Federal e sem interferência nas atribuições de órgãos da Administração Pública federal por lei de iniciativa parlamentar.
Também, sustentou que a estimativa do gasto sem indicação precisa da fonte de custeio viola o devido processo legislativo em matéria de finanças públicas e que as fontes de financiamento constantes do artigo 6º da lei questionada não garantem a neutralidade da despesa.
Especificou, inclusive, que a transferência criada pela lei recorrida, que corresponde a aproximadamente 18% (dezoito por cento) das despesas discricionárias atuais do Ministério da Educação, é despesa primária sujeita ao teto de gastos, o que agrava a situação fiscal já precária em que se encontram os gastos submetidos a esse limite e, por fim, defendeu que o prazo para execução da despesa era pouco razoável, não havendo possibilidade fática de seu cumprimento.
No mérito, o pedido foi pela inconstitucionalidade integral do diploma legislativo e, alternativamente, o pedido foi pela declaração de inconstitucionalidade do artigo 2º, caput, da Lei nº 14.172/2021, ou seja, do valor a ser transferido pela União aos Estados e ao Distrito Federal, e, ainda, a declaração da inconstitucionalidade do prazo previsto no artigo 2º, § 2º, estabelecendo-se que as transferências previstas no caput do dispositivo fossem realizadas quando forem implementadas as condições de adequação orçamentária.
Decisões cautelares
Em 17 de dezembro de 2021, o Min. Dias Toffoli, relator da ação, deferiu parcialmente o pedido de medida cautelar para prorrogar o término do prazo do art. 2º, § 2º, da Lei nº 14.172/2021, conferindo 90 (noventa) dias, a contar da decisão, para o cumprimento do repasse previsto no caput do art. 2º; e prorrogar o prazo do art. 2º, § 3º, da Lei nº 14.172/2021, por 6 (seis) meses, a contar da efetiva transferência de recursos.
O processo seguiu seus tramites regulares e recebeu mais uma decisão monocrática no final de abril de 2022. Nessa ocasião o relator salientou a então edição do Decreto nº 10.952, de 27 de janeiro de 2022, que estabelece os critérios de transferência automática de recursos, a título de apoio financeiro, aos Estados e ao Distrito Federal, para a garantia de acesso à internet, com fins educacionais, a alunos e a professores da educação básica pública, por meio da Plataforma +Brasil.
Em consulta a essa plataforma indicada no ato normativo, foi constatado que a União adotou os trâmites administrativos cabíveis para o cumprimento da determinação legal, observando o prazo designado na decisão monocrática anteriormente proferida.
O relator relembrou os beneficiários do programa e que a elaboração de uma política pública que garanta a conectividade à internet a cada um desses beneficiários demanda tempo, planejamento, organização e articulação entre os órgãos competentes, tudo isso com observância aos trâmites administrativos que garantem a publicidade dos atos praticados e a idoneidade do processo, bem como respeitando as condições estipuladas pelo ente federal. Para ele, a cooperação interfederativa, seja na aplicação, seja no monitoramento dos recursos, é fundamental para a efetividade da política, mas um prazo tão pequeno para a execução pode comprometer a operacionalização do programa.
Nesse sentido, tal como reconhecido na decisão que deferiu a primeira medida cautelar, o relator estava atento para a viabilidade do cumprimento da determinação estipulada pela lei, sob pena da própria política pública estar fadada ao insucesso.
Inclusive:
... o tema se encontra em discussão no Congresso Nacional, mediante a análise da Medida Provisória nº 1077/2021, que institui o Programa Internet Brasil e altera dispositivos da Lei nº 14.172/2021.
O texto que foi recentemente aprovado pela Câmara dos Deputados e seguiu para o Senado no último dia 20 de abril atribui nova redação ao art. 2º, § 3º, da Lei nº 14.172/2021, para prorrogar o prazo máximo de aplicação dos recursos para até 31 de dezembro de 2023 e o prazo de devolução dos valores não utilizados para 31 de março de 2024. (Trecho da decisão proferida na ADI 6936)
Neste ponto, o relator entende que é razoável conceber a dilatação do prazo indicado para a aplicação dos recursos, assim como daquele que foi estipulado para a devolução dos valores não utilizados, ambos previstos no art. 2º, § 3º, da Lei nº 14.172/2021, pelo menos enquanto a questão aguarda conclusão no âmbito parlamentar.
Mais uma vez, portanto, em caráter cautelar, foi prorrogado o prazo para a aplicação dos recursos transferidos pela União aos Estados e ao Distrito Federal até o término do exercício financeiro corrente, ou seja, até 31 de dezembro de 2022, sem prejuízo da concessão de prazo maior pelo Congresso Nacional; também foi prorrogado o prazo máximo para a devolução dos valores que não forem aplicados tempestivamente ou que forem aplicados em desconformidade com a Lei nº 14.172/2021 para 31 de março de 2023, sem prejuízo da concessão de prazo maior pelo Congresso Nacional.
Decisão por unanimidade
Posteriormente, o Tribunal, por unanimidade, conheceu parcialmente do pedido contido na ADI para dele excluir o art. 2º, § 3º, alterado pela Lei nº 14.351/2022; os demais preceitos da Lei nº 14.172/2021 foram julgados todos constitucionais.
O ministro Dias Toffoli afirmou que a educação é o primeiro dos direitos sociais consagrados na Constituição de 1988 e que o acesso à internet é um pressuposto para sua concretização, fato que ficou mais evidente diante do contexto da pandemia de covid-19.
Ele concluiu, portanto, que a Lei 14.172/2021 foi ao encontro do mandamento constitucional sobre o direito à educação e do princípio segundo o qual o ensino será ministrado com "igualdade de condições para o acesso e permanência na escola".
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