No dia 09 de junho, o Supremo Tribunal Federal julgou três processos de forma conjunta, decidindo que instituições de ensino privado não precisam estender para os estudantes já matriculados as promoções que são ofertadas aos eventuais novos alunos.
Algumas instituições vinham sendo obrigadas a estender as promoções em razão de leis estaduais, como a Lei nº 15.854/2015, do Estado de São Paulo e a Lei n.º 16.559/19, do Estado de Pernambuco.
O teor dos atos normativos impugnados via Ação Direta de Inconstitucionalidade
As leis estaduais obrigam os fornecedores de serviços prestados de forma contínua no Estado respectivo a conceder a seus clientes preexistentes os mesmos benefícios de promoções posteriormente realizadas. Estas leis impugnadas judicialmente mediante ações diretas de inconstitucionalidade enquadram na classificação de prestadores de serviços contínuos, dentre outros serviços privados, os serviços de educação.
A ADI 6614-RJ
As decisões proferidas nas ADIs julgadas neste mês de junho de 2022 seguiram o mesmo entendimento da Corte quando da decisão na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 6.614-RJ, julgada no final de 2021. À época, a autora da ação, a Confenem - Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino, alegou violação da autonomia administrativa e financeira das universidades e faculdades privadas e violação da competência legislativa privativa da União para legislar sobre direito civil, diretrizes e bases da educação nacional. Também expôs a afronta aos princípios da ordem econômica e financeira, ao ato jurídico perfeito e aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
Arguiu que as instituições de ensino superior privadas, inseridas no Sistema Federal de Ensino, não podem ser disciplinadas por legislações estaduais ou municipais, demonstrando, por fim, como a interferência em sua livre iniciativa e livre concorrência pode ocasionar prejuízos financeiros.
A decisão do Supremo Tribunal Federal – ADI 6614
O primeiro tema analisado pela Corte foi sobre a competência legislativa para dispor sobre a contraprestação pelos serviços educacionais. O dispositivo legal impugnado institui obrigação dirigida às instituições de ensino privadas consistente em “conceder, a seus clientes preexistentes, os mesmos benefícios de promoções posteriormente realizadas”.
No caso, o STF já assentou, em diversos precedentes, que a disciplina jurídica pertinente às formas de pagamento pela prestação de serviços escolares ou educacionais diz respeito às obrigações civis, cabendo sobre o tema privativamente à União legislar, por traduzir matéria própria ao direito civil e ao direito contratual.
Essa delimitação na matéria - prevista no art. 21, I, da CF - veda aos Estados-membros disporem sobre aspectos contratuais da relação jurídica entre as instituições de ensino privadas e os respectivos estudantes, salvo a possibilidade da atuação supletiva dos entes estaduais em matéria pertinente à defesa dos consumidores em face de situações de interesse local (CF, art. 24, V e § 2º).
E, no caso, em se tratando da competência dos Estados-membros para dispor supletivamente sobre consumo e proteção ao consumidor, o STF também já teve a oportunidade de julgar a controvérsia da obrigatoriedade ou não de fornecedores de serviços prestados de forma continuada, sejam prestadoras de serviços públicos ou privados, estenderem aos clientes preexistentes os benefícios oferecidos a novos consumidores.
Ao apreciar esta questão (de conteúdo virtualmente idêntico ao das leis estaduais contestadas), o Plenário da Corte conferiu interpretação conforme à Constituição e entendeu no sentido de que a obrigação instituída pela norma se refere ao dever das prestadoras de serviços continuados informarem aos clientes preexistentes sobre as novas promoções veiculadas pelo fornecedor, cabendo ao próprio cliente, com base nesse conhecimento, decidir se a proposta lhe é vantajosa ou não, para que possa, querendo, adotar as medidas pertinentes.
Como se vê, portanto, segundo esse entendimento e decisão do STF, não há uma obrigação das instituições de ensino privadas de atualizarem, automaticamente, os contratos preexistentes em conformidade com as novas propostas veiculadas ao público.
O que deve ocorrer, como um dever dos fornecedores de serviços de prestação continuada, é a informação aos clientes antigos sobre a existência de novas condições contratuais disponíveis aos consumidores, de modo que os usuários possam, a partir dessa informação, decidir se existe ou não interesse na oferta.
A ADI 6.333
No julgamento da ADI 6.333, que buscava a inconstitucionalidade da Lei n.º 16.559/19, do Estado de Pernambuco, o Ministro Alexandre de Moraes, fez as seguintes considerações:
“A Lei 16.055/2017 do Estado de Pernambuco, cujo conteúdo foi reproduzido pelo artigo 35 da Lei pernambucana 16.559/2019, tem reflexos no campo das atividades fornecidas e do direito do consumidor, porém com especificidade e priorização deste. Embora a lei tenha como destinatárias empresas dedicadas aos serviços continuados, sua principal finalidade é a implementação de um modelo de informação ao consumidor usuário daqueles serviços, no qual a oferta de novos benefícios e condições contratuais é, em carácter informativo e facultativo, estendida ao consumidor preexistente. 5. Não há violação ao princípio da isonomia (CF, art. 5º, caput) quando a lei estadual apenas permite que chegue ao conhecimento de clientes preexistentes as mesmas promoções oferecidas para atrair nova clientela.”
Segundo o Ministro, da mesma maneira, a legislação estadual não obriga as instituições de ensino privadas a atualizarem automaticamente os contratos preexistentes em conformidade com as novas propostas veiculadas ao público, existindo apenas o dever – como fornecedoras de serviços de prestação continuada que são - de informarem os estudantes antigos sobre a existência de novas condições contratuais disponíveis.
A mesma solução foi aplicada à Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 6191, ajuizada em razão da Lei nº 15.854/2015, do Estado de São Paulo.
Enfim, houve uma procedência parcial dos pedidos nas ADIs, conferindo às leis estaduais interpretação conforme à Constituição; um reforço à tese jurídica fixada no Informativo 1037/STF: é inconstitucional lei estadual que impõe aos prestadores privados de serviços de ensino a obrigação de estender o benefício de novas promoções aos clientes preexistentes.
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