Em 17 de março de 2020 foi publicada a Portaria n. 343. Em seu art. 1º autoriza, em caráter excepcional, a substituição das disciplinas presenciais em andamento por aulas que utilizem meios e tecnologias de informação e comunicação, nos limites estabelecidos pela legislação em vigor, por instituição de educação superior integrante do sistema federal de ensino.
O período de autorização de que trata o caput do art. 1º foi de até trinta dias, prorrogáveis, a depender de orientação do Ministério da Saúde e dos órgãos de saúde estaduais, municipais e distrital (§ 1º do art.1º da Portaria). Posteriormente, a Portaria 395, do mês de abril e Portaria n. 473, que entrou em vigor no dia 15 de maio, prorrogaram o prazo previsto originalmente.
A portaria vinha sendo reeditada, talvez porque a SERES não esperava que a suspensão das aulas fosse necessária por tanto tempo ou para evitar efeitos psicológicos de uma previsão de isolamento de longo prazo no início da pandemia.
Dia 17 de junho, porém, foi publicada a Portaria n º 544, já em vigor, que revoga expressamente as Portarias MEC nº 343, nº 345 e nº 473, todas desse ano, e dispõe sobre a substituição das aulas presenciais por aulas em meios digitais até o dia 31 de dezembro.
De acordo com a ABMES, hoje temos 80% das faculdades privadas ofertando aulas remotas; as demais optaram por suspender as aulas. Daí a importância dessa norma.
No texto da nova norma vieram algumas novidades e neste post destacaremos as mudanças iniciais, que entendemos ser mais conceituais. No próximo artigo trataremos de aulas práticas e estágio.
Vejamos as modificações com auxílio do quadro 1.
Como visto acima, algumas importantes alterações estão incluídas no texto. Em nosso destaque estão quatro pontos relevantes:
• A mudança de prazo, já muito comentada e, segundo a SERES, decorrente do Decreto Legislativo 6/2020;
• A permissão da substituição para disciplinas novas, ou seja, que não estavam em andamento no início das autorizações para aulas remotas;
• A referência a outros meios, o que deixa claro que "atividades não presenciais" é um termo que vai além de aulas remotas;
• A substituição do conceitos - já ultrapassado - de disciplinas por "componentes curriculares" e "atividades letivas".
Estas mudanças são importantes porque esclarecem não apenas o período de aplicação da substituição de atividades, mas a natureza dessa substituição.
Seguindo a linha do Parecer CNE/CP 05/2020, a norma aumenta a abrangência das medidas emergenciais. E faz isso do ponto de vista objetivo (permitindo que sejam aplicadas as regras a novas disciplinas e turmas) e do ponto de vista conceitual.
Apenas como referência, normas de instituições de ponta no Brasil, como a UFMG, já contém referência a Atividades Acadêmicas como gênero de conteúdos curriculares e a "disciplina" como uma das espécies de atividade.
Para uma referência, vale citar a norma da Instituição mineira que bem conceitua: "atividades acadêmicas curriculares" como "unidades de formação executadas em prazo determinado". Além disso, lista os seguintes tipos de atividades:
• Disciplina: atividade teórica, prática ou teórico-prática, conduzida por um ou mais docentes de acordo com um programa de ensino;
• Projeto: atividade executada pelo estudante sob a orientação de um ou mais docentes, para cuja conclusão exige-se a elaboração de produtos ou a demonstração da capacidade de execução de procedimentos que se caracterizem como os resultados do projeto;
• Programa: atividade que prevê a execução, pelo estudante, de tarefas no contexto de organizações, associações, entidades ou instituições, cuja intencionalidade pedagógica se constitui predominantemente na forma processual, na própria execução das tarefas, não se concentrando em eventuais produtos finais, como relatórios, ou em apresentações finais;
• Estágio: atividade que visa desenvolver o aprendizado através da vivência profissional, sob a orientação de um ou mais docentes e a supervisão de profissional no ambiente de trabalho; e
• Evento: atividade de curta duração que visa à geração, ao intercâmbio ou à disseminação do conhecimento, tipicamente envolvendo a participação de público ou de convidados externos ao curso ou à estrutura formativa.
No plano nacional, Diretrizes Curriculares também usam essa nomenclatura. A DCN de engenharia, por exemplo, prevê atividades de ensino-aprendizagem, de "natureza básica, específica, de pesquisa e de extensão, incluindo aquelas de natureza prática, entre outras" (Resolução CNE/CES 02/2019).
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Importante destacar que a mudança de nomenclatura ainda não é consensual. AS DCN de medicina veterinária, que são posteriores às de engenharia e representam uma das mais recentes normas sobre currículo, retomam a dicotomia entre disciplinas e atividades de ensino/aprendizagem (Art 17, da Resolução CNE/CES 3/2019). Ou seja, tratam as "disciplinas" em separado das atividades de aprendizagem.
Entretanto, o mais recente parecer do CNE sobre diretrizes curriculares, que trata de publicidade de propaganda, volta ao tema e menciona: "atividades didáticas tais como disciplinas, oficinas, atividades laboratoriais, discussões temáticas e seminários" (Art. 17, parágrafo único, da minuta contida no Parecer CNE/CES 146/2020, ainda não homologado).
Portanto, é relevante dizer que não apenas "disciplinas", mas quaisquer atividades letivas e componentes curriculares podem ser substituídos.
Outra questão relevante é que, agora, a norma sobre substituição menciona "outros meios convencionais" como complemento às atividades que utilizam recursos educacionais digitais, tecnologias de informação e comunicação (aulas remotas e teleorientação).
A expressão é bastante bastante vaga e dúbia. Outros meios convencionais, na verdade, parece ser o oposto do necessário nesse momento incomum, que demanda inovação. Mas talvez o melhor seja interpretar toda a expressão como "outros meios pedagogicamente aceitáveis" ou cientificamente testados. Agindo assim é possível preservar a principal alteração pretendida, que é firmar a ideia de que, além das aulas remotas, podem ser usados outros meios, como atividades de extensão ou mesmo desafios e simulações para grupos de alunos.
Essas mudanças, menos comentadas que as relativas a disciplinas práticas e estágios, são muito relevantes para as Instituições de Ensino, que agora têm liberdade para criar seus novos planos emergenciais para o segundo semestre. É bom saber que, mesmo sem alarde, o MEC aceitou as limitações de suas primeiras normas, naturalmente contaminadas pela urgência daquele momento inicial da pandemia.
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