O Ministério da Educação divulgou no Diário Oficial da União os novos procedimentos e critérios para habilitação de Instituições Privadas de Ensino Superior (IPES) interessadas em ofertar cursos de educação profissional técnica de nível médio.
A portaria revoga a de nº 401, de 10 de maio de 2016, e faz parte do Programa Novos Caminhos do MEC, lançado em outubro de 2019 com o objetivo de ampliar em 80% as matrículas de alunos nestes cursos. A ideia, de acordo com o Governo, é que as matrículas na educação profissional e tecnológica chegue a 3,4 milhões até 2023.
Histórico
Em 2011, o Governo Federal, por meio da Lei nº 12.513, criou o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), com a finalidade de ampliar a oferta de cursos de Educação Profissional e Tecnológica (EPT), por meio de programas, projetos e ações de assistência técnica e financeira.
Seus objetivos eram expandir as redes federal e estaduais de EPT, ampliar a oferta de cursos a distância, ampliar o acesso gratuito a cursos de EPT em instituições públicas e privadas, ampliar as oportunidades de capacitação para trabalhadores de forma articulada com as políticas de geração de trabalho, emprego e renda e difundir recursos pedagógicos para a EPT.
Para tanto, articulou iniciativas e firmou parceria com instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, com instituições de educação profissional e tecnológica das redes estaduais, distrital e municipais, com instituições dos serviços nacionais de aprendizagem e com instituições privadas de ensino superior e de educação profissional e tecnológica devidamente habilitadas para a oferta de cursos técnicos de nível médio.
O público do Pronatec são os estudantes do ensino médio da rede pública, inclusive da educação de jovens e adultos, trabalhadores, beneficiários dos programas federais de transferência de renda e estudantes que tenham cursado o ensino médio completo em escola da rede pública.
Disciplinando alguns tópicos do programa, em 10 de maio de 2016 – em uma nova etapa da iniciativa - é publicada a Portaria 401, que dispõe sobre a oferta de curso de educação profissional técnica de nível médio por instituições privadas de ensino superior.
Nesta portaria, dentre outras estipulações, estabeleceram-se critérios cumulativos que deveriam ser observados pelas Instituições Privadas de Ensino Superior para que pudessem ofertar cursos técnicos, quais sejam:
1. Conceito Preliminar de Curso - CPC ou Conceito de Curso - CC de reconhecimento ou renovação de reconhecimento, o mais recente, igual ou superior a três, no curso de graduação em área de conhecimento correlata ao curso técnico a ser ofertado;
2. Índice Geral de Cursos - IGC ou Conceito Institucional - CI, o que for mais recente, igual ou superior a três;
3. Inexistência de supervisão institucional ativa;
4. Inexistência de penalidade institucional, nos dois anos anteriores à oferta, nos cursos de graduação correlatos aos cursos técnicos a serem ofertados;
5. Garantia de condições de acessibilidade e de práticas educacionais inclusivas; e
6. Realização de pesquisa de avaliação de egressos, por mantenedora, de seis a doze meses após a conclusão dos cursos.
Além disso os cursos técnicos a serem ofertados pelas IPES deveriam atender às seguintes condições:
1. Estar incluído na relação de cursos técnicos constante na tabela de mapeamento prevista pela Portaria SETEC/MEC nº 01, de 2 de janeiro de 2014;
2. Possuir ato autorizativo aprovado em órgão competente;
3. Dispor de infraestrutura física, tecnológica e de pessoal para o desenvolvimento adequado do curso, especialmente no que se refere às atividades teóricas e práticas, no mesmo endereço do curso superior correlato; e
4. Considerar o limite de vagas igual ao número de vagas autorizadas para o curso superior correlato.
Com a modificação na agenda do Governo Federal, ainda na gestão Temer, o Pronatec foi esvaziado. Posteriormente, já no comando de Bolsonaro, um novo programa é lançado, o Novos Caminhos, inegavelmente inspirado no anterior, apesar do discurso da inovação, prevendo, da mesma maneira, parcerias com o Sistema S, a rede federal e as faculdades privadas.
A Portaria MEC nº 1.718, de 2019
A portaria nº 1718/2019 do MEC dispõe sobre a oferta de cursos de educação profissional técnica de nível médio ofertados por Instituições Privadas de Ensino Superior e revoga a portaria anterior, a de nº 401/2016, que disciplinava tópicos do Pronatec.
Se refere a instituições credenciadas para oferta de cursos superiores de graduação e registrados no Cadastro Nacional de Cursos e Instituições de Educação Superior - Cadastro e-MEC - sem o financiamento com recursos federais de que trata a Lei nº 12.513, de 2011, que instituiu o Pronatec.
Pela nova regra, são critérios cumulativos para que as Instituições Privadas de Ensino Superior possam ofertar cursos técnicos, além de estar com seus dados atualizados no e-MEC para que seja possível a análise do pedido de habilitação:
1. Índice Geral de Cursos - IGC ou Conceito Institucional - CI, o que for mais recente, igual ou superior a 3 (três);
2. Atuação em curso de graduação em área de conhecimento correlata à do curso técnico a ser ofertado previsto no Catálogo Nacional de Cursos Técnicos organizado pelo Ministério da Educação, conforme a Tabela de Mapeamento constante no Anexo desta Portaria; e
3. Excelência na oferta educativa comprovada por meio dos seguintes indicadores:
Conceito Preliminar de Curso - CPC ou Conceito de Curso - CC, igual ou superior quatro no curso de graduação, da área de conhecimento correlata ao curso técnico a ser ofertado;
inexistência de supervisão institucional; e
inexistência de penalidade institucional, nos dois anos anteriores à oferta, nos cursos de graduação correlatos aos cursos técnicos a serem ofertados.
A IPES, uma vez habilitada, registra o pedido de autorização para a oferta dos cursos no Sistema Nacional de Informações da Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação e faz a inserção do respectivo plano de curso, que deverá demonstrar coerência com o Plano de Desenvolvimento Institucional da Instituição Privada de Ensino Superior e ainda atender o disposto nas diretrizes curriculares nacionais para a educação profissional técnica de nível médio definidas pelo Conselho Nacional de Educação - CNE e demais normatizações associadas.
Quando do registro do pedido deverão ser apresentados:
a identificação do curso técnico - denominação, número de vagas, modalidade de oferta (presencial ou a distância) e código e-MEC do curso de graduação correlato;
a justificativa e objetivos - razões da instituição para a oferta do curso na região, fundamentada em pesquisas do setor produtivo e das ocupações existentes, evidenciando-se a demanda pelo curso com estudo de viabilidade;
os requisitos e formas de acesso - critérios de escolaridade, idade e condições para a admissão do candidato ao curso;
o perfil profissional de conclusão - competências requeridas para o exercício da profissão ou da ocupação correspondente previstas no Cadastro Nacional de Ocupações ou em outros registros reconhecidos no mercado de trabalho;
a organização curricular - estrutura básica do curso, contendo itinerários formativos e possibilidades de certificações em qualificações profissionais intermediárias, coerentes com requisitos do perfil profissional de conclusão, assim como carga horária e descrição das metodologias;
os critérios de aproveitamento de conhecimentos e experiências anteriores - procedimentos de avaliação de conhecimentos e experiências adquiridos anteriormente pelo aluno;
os critérios de avaliação - sistema de avaliação a ser utilizado, incluindo estratégias de acompanhamento para a superação das dificuldades de aprendizagem dos alunos;
as instalações e equipamentos - infraestrutura para desenvolvimento do curso coerente com a modalidade de oferta do curso (presencial ou a distância);
o pessoal docente e técnico - quadro de pessoal envolvido no processo de desenvolvimento de aprendizagem com a indicação da adequada formação e qualificação profissional para a função;
os certificados e diplomas - documentos a serem expedidos conforme a proposta do plano de curso; e
a Proposta de Estágio Supervisionado, incluída sua carga horária, conforme a Lei nº 11.788, de 25 de setembro de 2008, prevendo-o como ato educativo quando estabelecido pela instituição de ensino no plano de curso, ou como obrigatório em função da natureza da ocupação.
A Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica procederá à análise documental e, em caso de deferimento, expedirá ato autorizativo do Secretário de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação para cada um dos cursos.
Estes atos autorizativos serão expedidos para cada curso de educação profissional técnica de nível médio e terão validade de três anos, podendo ser renovados por igual período.
Semelhanças e diferenças entre as portarias
Ambas as portarias, como requisitos para autorização dos cursos técnicos, exigem da IPES:
índice Geral de Cursos - IGC ou Conceito Institucional - CI, o que for mais recente, igual ou superior a três;
que não exista supervisão institucional;
que não exista penalidade institucional nos dois anos anteriores à oferta, nos cursos de graduação correlatos aos cursos técnicos a serem ofertados;
que esta possua ato autorizativo aprovado em órgão competente, conforme a legislação em vigor;
Em relação à excelência na oferta educativa, pela nova portaria o Conceito Preliminar de Curso - CPC ou Conceito de Curso - CC, deve ser igual ou superior a quatro no curso de graduação da área de conhecimento correlata ao curso técnico a ser ofertado, enquanto na portaria revogada deveria ser igual ou superior a três.
No que se refere à infraestrutura exigida da IPES, hoje não mais se exige que os cursos técnicos sejam ofertados no mesmo endereço do curso superior correspondente, mesmo porque a modalidade de EAD será amplamente utilizada; as instalações e equipamentos devem ser coerentes com a modalidade de oferta do curso, presencial ou não.
Pela portaria nº 401/16 os cursos técnicos a serem ofertados deveriam estar incluídos na relação de cursos técnicos constante na tabela de mapeamento prevista pela Portaria SETEC/MEC nº 01, de 2 de janeiro de 2014. Hoje, via portaria nº 1718/2019, a oferta deve respeitar o Catálogo Nacional de Cursos Técnicos organizado pelo MEC, conforme a Tabela de Mapeamento constante no anexo da própria norma.
O novo regramento do MEC não é expresso quanto à garantia de condições de acessibilidade e de práticas educacionais inclusivas, como o era anteriormente, não exige das IPES realização de pesquisa de avaliação de egressos e não considera o limite de vagas nos cursos técnicos igual ao número de vagas autorizadas para o curso superior relacionado.
Mudanças
Não há como desassociar: falar da nova portaria do MEC importa em falar no programa Novos Caminhos, programa do atual governo para a educação profissional e tecnológica. Ele guarda algumas semelhanças com o Future-se, também buscando aumentar a privatização da educação pública e vincular a produção de conhecimento aos interesses do mercado.
Além das mudanças nos critérios técnicos para habilitação e autorização do funcionamento dos novos cursos, o Novos Caminhos, via portaria nº 1718/2019, não acena com dinheiro federal, mas com outras formas de incentivo, como o compartilhamento da infraestrutura dos Institutos Federais.
O Ministro da Educação resolve:
“Art. 1º Estabelecer as normas para a oferta de cursos de educação profissional técnica de nível médio por Instituições Privadas de Ensino Superior - Ipes, devidamente credenciadas para oferta de cursos superiores de graduação e registrados no Cadastro Nacional de Cursos e Instituições de Educação Superior - Cadastro e-MEC, sem o financiamento com recursos federais de que trata a Lei nº 12.513, de 2011”. (lei do Pronatec, não revogada).
Fato que não se sabe com clareza como será o financiamento do Novos Caminhos, que promete turbinar a expansão de vagas, mas não especifica quanto dinheiro será investido. O professor Dante Moura, do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN) e coordenador do grupo Trabalho e Educação da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped), levanta a questão:
“não há algo definido como perene para ser o financiamento desse programa que se coloca a ousada meta de aumentar em 80% as matrículas. Evidentemente isso não vai se alcançar. Pelo menos, não da forma que o Plano Nacional de Educação prevê. O PNE prevê triplicar a oferta de educação profissional durante seus dez anos de vigência. Nos cinco primeiros anos, dentre os quais nos três primeiros não existia o efeito da EC 95, houve uma ampliação de investimento e uma diminuição da oferta. Como, nos próximos dois anos, haverá uma ampliação de 80%? E sem a definição clara de uma fonte financeira?”
O professor ainda questiona como seria o compartilhamento da infraestrutura dos Institutos Federais com estados e como o equilíbrio se torna confuso diante de um contexto de restrição orçamentária.
Enfim, os novos critérios apresentados pelo MEC que modificam a habilitação para que IPES ofertem cursos de educação profissional técnica de nível médio são detalhes burocráticos perto de mudanças significativas como a possibilidade de utilização de EAD e do fim do financiamento por parte do governo federal.
A portaria vem, de fato, regulamentar o Programa Novos Caminhos e a análise da norma deve respeitar o contexto ideológico na qual ambos estão inseridos.
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