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Ana Luiza Santos e Edgar Jacobs

O ensino híbrido veio para ficar

O ensino híbrido é uma abordagem pedagógica que combina atividades presenciais e atividades realizadas por meio das tecnologias digitais de informação e comunicação.


Há várias maneiras e propostas de como as atividades podem ser combinadas, mas, em essência, o modelo consiste em focar o processo de aprendizagem no aluno e não na transmissão vertical de informação tradicional.


No caso do ensino híbrido, o aluno não só estuda o que o professor transmite em sala de aula, mas também em diferentes situações e ambientes. A sala de aula, então, passa a ser o local de aprendizado ativo. É nela que ocorrerão as atividades de resolução de problemas e discussões, com a mediação do professor e de forma colaborativa com os colegas.


Setores/processos de produção


O interessante é que o ensino híbrido não chegou sozinho. Ele seguiu uma tendência de mudança que ocorreu em quase todos os serviços e processos de produção de bens que abraçam os recursos das tecnologias digitais.


Ou seja, ele não é mais um modismo, mas uma proposta que, com o reforço da pandemia, veio pra ficar.


Esse ponto foi levantado por José Armando Valente, no livro “Ensino Híbrido, Personalização e tecnologia na educação”, e é bastante pertinente.


O professor recorda o sistema bancário no início dos anos de 1980, no qual o cliente de um banco era totalmente dependente e vinculado a determinada agência. Hoje, a informatização do sistema autoriza que o cliente, por meio do cartão do banco, traga consigo todas as informações de modo que qualquer agência do banco possa reconhecê-lo. Também há transações bancárias via celular, diretamente de casa e 24 horas. O banco tornou o cliente independente e responsável por gerenciar suas atividades bancárias.


As agências bancárias não foram extintas, mas mudaram suas funções, o mesmo acontecendo com serviços como comércio, lojas, supermercados e restaurantes por quilo. A regra hoje é a do cliente se servindo. Houve uma mudança no foco das atividades: antes estava nos agentes que proviam os serviços e agora está no usuário.


Para o professor José Armando Valente, o mesmo vale para praticamente todos os serviços e processos de produção que foram implantados até as primeiras décadas do século XXI, ressaltando que, até agora, um dos poucos serviços que ainda não passou de maneira robusta por essas inovações foi a educação, cujo foco ainda está no professor, que detém a informação e, de certa forma, “serve” a seu aluno.


Pandemia


Antes da pandemia usávamos a tecnologia todo o tempo fora da sala de aula, mas na escola os alunos ainda encontravam ‘giz e quadro negro’. A sala de aula ainda não tinha entrado na cultura digital, o que se modificou com a paralização das aulas presenciais e colocou em pauta a temática do uso da tecnologia na educação.


No início houve a simples transposição do presencial para o virtual, uma espécie de puxadinho, usando a própria dinâmica da sala de aula, com o aluno olhando um quadro durante um certo número de horas. No segundo semestre, com um melhor preparo, as soluções foram mais híbridas, com o uso, por exemplo, de ferramentas como a sala de aula invertida.


Apesar disso, a aprendizagem do aluno ainda está centrada na sala de aula, com a responsabilidade centrada no professor. Resta implantar na educação o que foi realizado nos outros serviços e processos de produção.


Responsabilidade do estudante


A responsabilidade da aprendizagem deve ser do estudante; é ele que precisa assumir uma postura participativa, resolvendo problemas, desenvolvendo projetos e, com isso, criando oportunidades para a construção de seu conhecimento.


A função do docente deve ser a de mediador, consultor do aprendiz, e a sala de aula deve ser o local onde o aprendiz tem a presença do professor e dos colegas auxiliando-o na resolução de suas tarefas e na significação da informação, para que ele possa desenvolver as competências necessárias para viver na sociedade do conhecimento.


Um ponto interessante é que já se sabe que o fato de o estudante ter contato com o material instrucional antes de adentrar a sala de aula é benéfico. Ele pode acessar o material no seu tempo e tentar compreender à sua maneira. Um texto pode ser explorado; os vídeos gravados podem ser revistos e, se o material está linkado a vários outros recursos tecnológicos, o aluno pode aprofundar suas percepções. Posteriormente ele levará o que apreendeu ao professor, que poderá guiar essas percepções. Aproveitar bem o momento presencial é uma meta a ser atingida.


Quando o estudante está consciente também consegue verificar suas próprias deficiências e identificar as áreas nas quais precisa de mais ajuda. O professor tem, então, a chance de selecionar os melhores temas para se trabalhar em sala de aula.


Desafios


Na obra “Ensino Híbrido, Personalização e tecnologia na educação”, Valente explica que os estudos sobre a percepção e o desempenho dos estudantes que participam das experiências com o ensino híbrido é que nos proporcionam as evidências de que essa abordagem pedagógica vale a pena.


Obviamente, há problemas. Alguns professores argumentam que os alunos não são maduros para aprenderem via atividades on-line ou assistindo a vídeos. Outros afirmam que o modelo é bastante dependente da tecnologia, o que pode criar um ambiente de aprendizagem desigual; afinal, nem todos os alunos dispõe dos recursos tecnológicos ideais (e da mesma maneira).


Há também o risco de o aluno não se preparar antes da aula e ficar sem condições de acompanhar o conteúdo presencial. Mas para o professor José Armando o que mais preocupa é a possibilidade de se banalizar a abordagem.


Neste ponto ele cita duas questões: já que o professor prepara o material para os alunos lerem/assistirem antes das aulas, ele já condensa a aula e o aluno, neste caso, não tem contato com materiais primários de autores especialistas na área.


Outra questão é o interesse pelo barateamento do processo educacional. Contrariamente ao senso comum, o projeto de ensino híbrido é custoso. A lógica é que professores com experiência produzam material de apoio e também sejam o suporte dos alunos. Não cabe aqui uma sala de aula com professores menos qualificados.


Gerir o processo de maneira diferente deturpa o aspecto mais importante do ensino híbrido, que é o de promover a autonomia e a responsabilidade do aprendiz, de modo que ele tenha um contato inicial com o material de apoio e, em sala de aula, possa ser desafiado por um professor bem preparado que saiba criar condições para consolidar o processo de construção do conhecimento e, claro, indicar mais material para estudo.


Implantação


A implantação do ensino híbrido requer excelente formação do professor, adequação do currículo, das atividades curriculares e da dinâmica de sala de aula. Propostas bem elaboradas evitam que o projeto seja corrompido e formas de trabalho já utilizadas sejam implementadas como inovadoras.


Nesse momento o ensino híbrido pode ser um excelente caminho e o que ele oferece como proposta de mudança no ensino tradicional pode nos trazer inúmeros benefícios. Definitivamente, ele veio para ficar: as teorias, experiências e argumentos pedagógicos estão à disposição dos educadores.


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