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A limitação dos polos na Portaria 528/2024 e o ato jurídico perfeito

Já nos manifestamos sobre o sobrestamento dos processos de abertura de cursos EAD, uma medida absurda imposta pela Portaria 528/2024. Entre os diversos problemas jurídicos e técnicos existentes na norma, destacamos aqui a vedação de abertura de novos polos.


O polo, segundo a Resolução CNE/CES 01/2016, é a "unidade acadêmica e operacional descentralizada" com o objetivo de oferecer "apoio político-pedagógico, tecnológico e administrativo às atividades educativas dos cursos e programas ofertados a distância" (Art. 5º). Trata-se de uma extensão da instituição de ensino no âmbito local e uma ferramenta essencial para a expansão segura da modalidade a distância.


Estas unidades acadêmicas também tiveram sua criação suspensa. O Art. 4º da Portaria 528/2024 determina o impedimento da abertura de polos até 10 de março de 2025. No caso dos polos, a vedação temporária é juridicamente contestável, sem sentido e contraproducente.


Já abordamos em artigo a falha jurídica dessa medida transitória implementada por meio de sobrestamento, que, na verdade, não configura um regime de transição. Além disso, há problemas concorrenciais, de proporcionalidade e de razoabilidade.


O efeito negativo pode ser resumido no fato de que a adequação natural dos cursos e programas EAD geralmente é feita a cada ano ou semestre. A cada ciclo podem ser criados e desativados polos, garantindo não só a ampliação, mas a adequação econômico-financeira dos programas. Com a suspensão, essa dinâmica será abruptamente interrompida, negligenciando o planejamento feito e as expectativas de ajuste natural entre oferta e demanda nacional.


A falta de lógica, ou ao menos de coerência, decorre de uma sutileza da moldura legal aplicável. A Portaria Normativa 11/2017, que regula o EAD, prevê um delay entre a criação do polo e o seu cadastramento no sistema eMEC. Isso ocorre não só na criação de polos, mas na alteração de endereço e na substituição deles nos projetos pedagógicos. Esse detalhe importante parece não ter sido considerado na norma de sobrestamento.


Vejamos o que diz a Portaria Normativa do EaD:


Art. 12. As IES credenciadas para a oferta de cursos superiores a distância poderão criar polos EaD por ato próprio, observando os quantitativos máximos definidos no quadro a seguir, considerados o ano civil e o resultado do Conceito Institucional mais recente: […]
Art. 13. A IES deverá informar, no Sistema e-MEC, seus polos de EaD criados, no prazo máximo de sessenta dias, a contar da expedição do ato próprio, mantendo atualizados os dados de pessoal, infraestrutura física e tecnológica, prevista no art. 11, documentação que comprove disponibilidade dos imóveis e eventuais contratos de parceria. […]
Art. 15. O remanejamento de vagas autorizadas de um curso de EaD entre polos é de competência da IES credenciada e deve ser processado como atualização cadastral.
Art. 16. A alteração de endereço de polo de EaD se processará como substituição de polo, ocasionando a baixa do código original, a geração de um novo código, restrito ao município de funcionamento, e a transferência dos cursos de EaD do primeiro para o segundo código.

A sequência de regras expõe a incoerência da suspensão, que pode ser sintetizada nos seguintes comentários:


  1. Se os polos são criados por ato próprio da Instituição e comunicados 60 dias depois, podem existir centenas ou milhares de polos já existentes e ainda não informados. Assim, apesar da suspensão do MEC, as Instituições podem pleitear a expansão que já contrataram.

  2. Os contratos e convênios de polos já assinados e prontos para ser implementados não podem ser desrespeitados. Documentos de polos que já foram criados não devem ficar fora do cadastro e-MEC.

  3. A situação já criou um problema concreto, pois o Ministério da Educação bloqueou o sistema sem respeitar o prazo de 60 dias.

  4. O bloqueio pode prejudicar também o remanejamento de vagas, impedindo os ajustes de oferta nos polos e o exercício de um direito que é comum inclusive nos cursos presenciais.

  5. A substituição de polo e até mesmo a alteração de endereço também podem ser colocados em dúvida e travados no sistema eletrônico, afinal, na prática, é tênue a diferença entre “criar” e “substituir” um polo.


Há notícia de que o sistema foi fechado e que até mesmo os polos incluídos no dia em que foi publicada a Portaria de sobrestamento foram deixados fora do cadastro. Por isso, as inconsistências acima já são um problema real.


Um contrato ou convênio de parceiro já assinado e com ato de criação de polo vigente não poderia ser desrespeitado nem mesmo por uma norma regular. Este acordo é um ato jurídico perfeito, constitucionalmente protegido e fora do alcance de portarias do MEC. Ato jurídico perfeito é aquele “já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou” (Art. 6º, Decreto Lei 4.657/1942). A Constituição de 1988 dá ampla proteção a este tipo de ato, afirmando que a lei não o “prejudicará” (Art. 5º, XXXVI), assim a questão não se cinge a cancelar ou não um convênio, por exemplo, mas a postergá-lo ou dificultar seus efeitos previsíveis.


No caso dos polos EaD, há prejuízo, mesmo sendo prevista uma suspensão por período determinado. Dificilmente uma parceria firmada hoje ficará intacta depois de quase um ano de sobrestamento ou, pior, após a mudança nas normas que regulam o objeto da contratação. Além do rompimento de contrato, o parceiro atual pode ter prejuízos por obras que já fez e a Instituição de Ensino pode arcar com multas e indenizações decorrentes da impossibilidade de funcionamento do Polo.


Diante dessas circunstâncias, a segurança jurídica necessária para a criação de polos ficará abalada e a situação será agravada pelo fato de que as Instituições Federais continuarão normalmente sua atividade e expansão (Art. 4º, parágrafo único da Portaria 528/2024). Esse conjunto de problemas deve gerar um nível de insegurança que pode resultar em litigância, no curto prazo, e dificuldade para a formalização de convênios, no médio e longo prazo.


Enfim, este é só um dos resultados da desajeitada e ilegal Portaria 528/2024. Desrespeito aos contratos e outros efeitos retroativos perversos não são uma boa maneira de iniciar mais essa etapa da interminável “reforma” das normas da educação a distância.


Quer saber mais? Deseja marcar uma reunião para discutir seu caso? acesse nossos contatos aqui. Ou visite o site do escritório de advocacia Jacobs Monteiro.


Sobre a legislação e processos administrativos no MEC consulte site do:



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