Grande atenção tem sido dada ao debate sobre o Projeto de Lei n° 2630/20, popularmente chamado de Projeto das Fake News. Este Projeto institui a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, estabelecendo normas, diretrizes e mecanismos de transparência de redes sociais e de serviços de mensageria privada através da internet, para desestimular o seu abuso ou manipulação com potencial de dar causa a danos individuais ou coletivos.
A lei se aplica a provedores de aplicação que oferte serviço de rede social ao público brasileiro com mais de dois milhões de usuários registrados, mesmo que as atividades sejam realizadas por pessoa jurídica sediada no exterior. Neste caso, a necessidade é que haja oferta de serviço ao público brasileiro ou pelo menos uma integrante do mesmo grupo econômico possua estabelecimento no Brasil.
Os objetivos da lei são:
combater a desinformação e fomentar a diversidade de informações na internet no Brasil, fortalecendo, com isto, o processo democrático;
buscar maior transparência sobre conteúdos pagos disponibilizados para o usuário;
desencorajar o uso de contas inautênticas para disseminar desinformação nas aplicações de internet.
O art. 5º do PL pretende vetar, nos usos de internet, contas fictícias; redes de disseminação artificial que veiculem desinformação e disseminadores artificiais (robôs, por exemplo) ou conteúdos patrocinados que não sejam informados como tal. Neste último caso, o usuário precisa saber que está recebendo uma informação a título de propaganda. O anúncio não pode chegar até o usuário a título de notícia/ciência/fato e, em relação a conteúdo patrocinado, deve ser claro quem pagou pelo conteúdo, qual o público-alvo e quanto foi gasto, em uma plataforma de fácil acesso a todos.
O PL é explícito ao prever que as vedações não implicarão restrição ao livre desenvolvimento da personalidade individual, à manifestação artística, intelectual, de conteúdo satírico, religioso, ficcional, literário ou qualquer outra forma de manifestação cultural, nos termos dos arts. 5º , IX e 220 da Constituição Federal.
Das Medidas contra a Desinformação
Google, Meta, Twitter, Microsoft, Apple, TikTok e Telegram são exemplos dos provedores de aplicação mencionados no PL. Cabem a eles as medidas necessárias para proteger a sociedade contra a disseminação de desinformação e, dentre elas, há a previsão da necessidade de se interromper imediatamente a promoção paga ou a promoção gratuita artificial do conteúdo falso, seja por mecanismo de recomendação ou outros mecanismos de ampliação de alcance do conteúdo na plataforma.
Além disso, devem rotular o conteúdo desinformativo como tal, desabilitar os recursos de transmissão deste conteúdo desinformativo para mais de um usuário por vez e assegurar o envio da informação verificada a todos os usuários alcançados pelo conteúdo desde sua publicação.
As medidas de boas práticas dos provedores devem ser proporcionais, não discriminatórias e não podem implicar em restrição ao livre desenvolvimento da personalidade individual, à manifestação artística, intelectual, de conteúdo satírico, religioso, ficcional, literário ou qualquer outra forma de manifestação cultural. O criador ou compartilhador do conteúdo que for acionado por desinformação terá a possibilidade de recorrer da decisão.
Serviços de mensagens
No caso de serviços de mensagens, o PL prevê um limite de número de encaminhamentos de uma mesma mensagem (05) e número máximo de membros de grupo de usuários (256). Em período de propaganda eleitoral, durante situações de emergência ou de calamidade pública, o número fica reduzido a 01 encaminhamento de uma mesma mensagem: a um usuário ou a um grupo.
O usuário, ao se cadastrar, deverá informar se fará uso de robôs e deverá ser comunicado e dar permissão para ser incluído em listas de transmissão, por exemplo. A ideia é que as empresas forneçam os serviços de mensagem privada utilizando-se de todos os meios ao seu alcance para limitar a difusão e assinalar aos seus usuários a presença de conteúdo desinformativo. A privacidade e o segredo de comunicações pessoais, incluindo a garantia do segredo do conteúdo em relação aos próprios provedores, ficam garantidos.
Conteúdos patrocinados – transparência
Os provedores devem exigir que todos os conteúdos patrocinados incluam rotulação que identifique que se trata de conteúdo pago ou promovido; que identifique o pagador do conteúdo, incluindo intermediários e pagador original do serviço e que direcione o usuário para acessar informações sobre o pagador do conteúdo, seja pessoa física ou jurídica, bem como seus dados de contato.
O provedor também precisa direcionar o usuário para acessar informações de quais as fontes de informação e os critérios utilizados para definição de público-alvo do conteúdo patrocinado e deve incluir dados sobre todos os conteúdos que o patrocinador realizou nos últimos doze meses, incluindo aqueles em execução quando receber a propaganda.
No art. 19 do PL há a determinação de que os provedores forneçam a todos os usuários, por um meio em destaque e de fácil acesso, a visualização do histórico de todos os conteúdos patrocinados com os quais o usuário teve contato nos últimos seis meses.
Quanto às redes sociais, elas devem tornar pública, em plataforma de acesso irrestrito e facilitado, dados sobre todos os conteúdos patrocinados ativos e inativos relacionados a temas sociais, eleitorais e políticos.
Punições
O art. 28 do PL prevê sanções para descumprimento das regras da norma, sem prejuízo das demais sanções civis, criminais ou administrativas. Obviamente assegurados o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório, os provedores de aplicação estarão sujeitos às penas de:
advertência, com indicação de prazo para adoção de medidas corretivas;
multa;
suspensão temporária das atividades;
proibição de exercício das atividades no país.
A gravidade do fato, as consequências nas esferas individual e coletiva; a reincidência na prática de infrações previstas na Lei e a capacidade econômica do infrator, em caso de multa, serão observadas para fixação e gradação da sanção.
Educação
No Projeto de Lei n° 2630/20, em seu art. 25, consta expressamente que o cumprimento do dever constitucional do Estado na prestação da educação, em todos os níveis de ensino, inclui a capacitação, integrada a outras práticas educacionais, para o uso seguro, consciente e responsável da internet, bem como campanhas para evitar a desinformação na internet e a promoção da transparência sobre conteúdos patrocinados.
É mais uma normativa que pretende reforçar a necessidade de o aluno possuir a habilidade de ler criticamente e participar de forma ativa do mundo conectado em que vivemos; necessidade que não é nova, mas que ganha mais urgência à medida que o fluxo de informação só tende a crescer.
De fato, a educação midiática já está prevista no BNCC (Base Nacional Comum Curricular). No texto, a sugestão é que o tema seja tratado nos anos finais do Ensino Fundamental, levando gêneros que circulam na esfera pública, nos campos jornalístico-midiático e de atuação na vida pública para análise dos estudantes.
Há, da mesma forma, o incentivo da discussão e exercícios envolvendo as dinâmicas das redes sociais e os interesses que movem a esfera jornalística-midiática. Os estudantes precisam entender a questão da confiabilidade da informação, como se proliferam as notícias falsas, a manipulação de fatos e opiniões e, como já previsto no documento, muitas das habilidades que precisam ser adquiridas se relacionam com a comparação e análise de notícias em diferentes fontes e mídias, com análise de sites e serviços checadores de notícias e com o exercício da curadoria.
A Política Nacional de Educação Digital também apresenta importantes eixos estruturantes a serem observados: o da inclusão digital; da educação digital escolar; da capacitação e especialização digital; e da pesquisa e desenvolvimento (P&D) em tecnologias da informação e comunicação (TICs).
Esta política de educação digital se assenta em um ponto importante sobre o qual já tratamos: o fato de crescer na era digital não torna os chamados “nativos digitais” inerentemente competentes e confiantes com as tecnologias digitais. Isso se dá pelo fato de que o uso da tecnologia é - em grande parte - restrito às atividades de lazer não escolares. E os estudantes precisam de mais: precisam de alfabetização ou letramento digital. Educar para a informação faz com que o aluno possa maximizar os benefícios que a internet pode proporcionar, bem como minimizar os potenciais danos.
E, em verdade, uma boa alfabetização ou letramento digital não exime os provedores de aplicação da responsabilidade pelos conteúdos que possibilitam disseminar.
Tramitação
O PL foi proposto pelo Senador Alessandro Vieira em maio de 2020; desde sua aprovação pelo Senado e o subsequente envio à Câmara dos Deputados o projeto foi objeto de cerca de 40 propostas de emendas, tramitando apensado a aproximadamente 90 projetos de lei correlatos.
No dia 25 de abril de 2023, em sessão da Câmara dos Deputados, teve sua tramitação em regime de urgência aprovada e no dia 27 de abril o relator, Dep. Orlando Silva, apresentou o parecer preliminar da relatoria, bem como a última versão do texto proposto através de novo substitutivo.
A expectativa era que fosse apreciado pelo plenário da Câmara dos Deputados no dia 02 de maio de 2023, mas foi retirado de pauta a pedido do próprio relator, sob argumentação de que precisaria de mais tempo para incorporar novos pontos ao texto. A principal dificuldade de acordo entre os congressistas está em definir quem fiscalizará o cumprimento e as sanções impostas pela lei.
Acompanhe nossas publicações e saiba mais sobre a votação do projeto no momento oportuno.
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